ARAQUÉM ALCÂNTARA
Sustentabilidade

Certa vez, em Cubatão, no início dos anos 70, uma tempestade de chuva ácida caiu sobre a minha cabeça. Meu corpo foi tomado pela poluição líquida.
Enquanto corria para me abrigar percebi que toda aquela poluição é que gerava crianças sem cérebro e que a desgraça atingia sobretudo os mais miseráveis. Ali, naquela terra arrasada, dei meus primeiros passos na compreensão do que era sustentabilidade. Compreendi que nossas vidas dependem de uma Terra sadia – e não há Terra sadia sem bem estar social!
Meu neto outro dia, num relance, me perguntou como será o futuro. Fiquei com vontade de dizer que estamos próximos de uma catástrofe climática o que significa extinção de espécies, desertos se espalhando e florestas arrasadas, incêndios devastadores, ciclones, furacóes. Me deu vontade de dizer a todos os meninos- porque somente deles pode advir uma nova ética e consciência planetária – que a Terra está realmente em agonia, atingiu seu estado crítico por conta de nosso comportamento destrutivo e egoísta. Extraímos sem repor, envenenamos o ar, poluímos as águas, destruímos em segundos séculos de maravilhosa construção.
Dizer que é preciso um esforço extraordinário para aprender com a pandemia uma nova forma de viver – talvez a única possível de agora em diante: respeito a tudo o que é vivo, responsabilidade cotidiana em cada ato; a percepção de que tudo está interligado, que Terra e Homem formam um único organismo e que só haverá futuro se nos reconciliarmos com as sábias leis que regem este vasto complexo biológico.
Tudo o que temos feito é muito pouco. Navegamos entre a omissão e a hipocrisia. Veja o que estamos deixando acontecer com a maior riqueza deste país, a floresta amazônica, imensa amplitude verde de mais de cinco milhões de quilômetros quadrados, de extrema importância para o clima do planeta. Já permitimos a destruição de que 20 por cento de sua área e agora ela deve produzir muito menos chuva. A devastação já deveria ter sido interrompida há mais de uma década, dizem os cientistas, e a recuperação das florestas já deveria ter sido iniciada em igual tempo.
Como podemos permitir que os governos ignorem a ganância dos senhores de terras, a voracidade das grandes madeireiras, o enriquecimento ilícito, a soja e outras monoculturas avançando pela Amazônia, as carvoarias e mineradoras, o garimpo sangrando a terra , os indígenas perseguidos…
É possível mitigar os efeitos do aquecimento global, mas para isso é preciso encarar grandiosas responsabilidades. É é necessário respeitar a natureza como parte de nós mesmos, consumir com consciência, produzir menos lixo, reciclar o que for possível, consumir pouca eletricidade, pouca água, andar mais a pé ou de bicicleta. Que a partir de agora temos de procurar matérias-primas com certificação, e isso vale muito para a madeira, que deve ser obtida em florestas cultivadas e vir com selo de origem. Que é preciso exigir a imediata interrupção do desmatamento na Amazônia, nas áreas de mata atlântica e nos demais ecossistemas.
E numa escala mais ampla, temos de difundir o pensamento de que é preciso substituir o carbono fóssil por fontes de energia mais seguras; lutar contra toda agressão aos habitats naturais, combater a fome e a miséria, transformar esta estrutura social injusta, desigual e predatória que corrói o país. Porque as chances de a Terra continuar generosa e confortável são grandes, mas isso depende da construção de uma sociedade mais justa e em harmonia com a natureza. Se ensinarmos aos meninos essas lições daremos um sentido maior às nossas vidas e talvez nós os ajudemos a construir um futuro menos aterrorizante.